Representação dos estrangeiros na população residente e prisional, de 2008 a 2023

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No seguimento do meu último post, e também deste post, que dá conta de que o peso dos estrangeiros entre a popualação prisional subiu em 2023, resolvi pegar nos dados da população residente e do n.º de reclusos a 31 de dezembro de cada ano, ambos por nacionalidade, e fazer umas contas e gráficos. Ao INE, fui buscar os seguintes indicadores:

  1. População residente (N.º) por Sexo, Grupo etário e Nacionalidade (Grupos de países); Anual 
  2. Reclusas/os existentes em 31 de dezembro (N.º) nos estabelecimentos prisionais comuns por Sexo e Nacionalidade (País); Anual

Em seguida, calculei:

  1. proporção de residentes estrangeiros para cada ano, dividindo o nº de residentes estrangeiros pelo nº de residentes total.
  2. proporção de reclusos estrangeiros, dividindo o nº de reclusos estrangeiros pelo nº de reclusos total.
  3. índice de sobrerepresentação dos estrangeiros na população prisional face à população residente, divindo a proporção de reclusos estrangeiros pela proporção de residentes estrangeiros. Este índice mostra-nos o quão sobre-representado estão os estrangeiros face à sua representação na população em geral.

Exemplo de cálculo:

  • Se 40% dos reclusos de um país são estrangeiros e 10% da população geral é estrangeira, o índice seria 40% / 10% = 4.
  • Um país onde 20% dos reclusos são estrangeiros e 10% da população geral é estrangeira teria um índice de 20% / 10% = 2.

O gráfico de cima tem apenas os valores absolutos. O gráfico de baixo tem as percentagens, e o índice de sobre-representação dos estrangeiros.

O meu sumário destes dados:

  1. Antes da vaga de imigração dos últimos 5 anos, a população estrangeira nas nossas prisões era superior (em termos absolutos) ao que tem sido nos últimos anos. Apesar dos aumentos de reclusos estrangeiros em 2022 e 2023, ainda estamos com um número inferior a todos os anos compreendidos entre 2008 e 2017.
  2. A percentagem de estrangeiros na popuação prisional diminuiu de 2008 a 2017, e daí para a frente tem oscilado. Houve aumentos em 2022 e 2023, que ainda nem sequer atingiram os níveis de 2008 a 2015.
  3. Como em muitos outros países, os estrangeiros estão sobrerepresentados na população prisional face à população residente. Contudo, a queda deste indíce tem sido vertiginosa a cada ano que passa, desde 2016. Entre 2011 e 2015, havia 5x mais proporção de estrangeiros entre os reclusos que entre os residentes. Chegaram a ser mais de 20% da população prisional, quando não chegavam a 5% na população residente. Em 2023, este índice atingiu o seu valor mais baixo dos anos em análise, 1,7.

A minha conclusão:

É notável que, no período de 2008 a 2015, quando haveria mais razões para mostrar preocupação com o cometimento de crimes por estrangeiros, a cobertura mediática e o debate político sobre esse tema eram praticamente 0. Não me recordo de se fazer uma associação entre crime/insegurança e imigração, nessa altura, apesar de termos mais reclusos estrangeiros, em valores absolutos. Este tema tem sido completamente intrumentalizado pela direita radical, tendo contaminado o debate político, a cobertura mediática e a opinião pública. As percepções e sensações de insegurança que as pessoas reportam agora e não reportavam entre 2008 e 2015, quando o foco era a crise, a Troika e a austeridade, não têm ligação aos dados. Em particular, a associalção da criminalidade à imigração recente, é desprovida de substância. Os estrangeiros que têm chegado têm taxas de reclusão muito inferiores aos que cá viviam na altura em que não se fazia esta associação.